Carro novo e fábrica nova
- Pedro Junceiro
- há 8 minutos
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A fábrica nova da BMW em Debrecen, Hungria, encontra-se pronta a produzir o iX3, Sport Utility Vehicle (SUV) que introduz a “Neue Klasse” da BMW. E-AUTO visitou esta unidade industrial para perceber as razões por detrás da decisão (arriscada!) de produzir carro novo numa fábrica nova. Milan Nedeljkovic, da administração do consórcio, diz que a capacidade e o simbolismo foram determinantes, assim como as lições aprendidas com o i3.

Em Debrecen, Hungria, o Grupo BMW apresenta capítulo novo no livro da sua história, ao mesmo tempo que prepara a introdução no mercado do primeiro membro da família nova de automóveis elétricos “Neue Klasse”, a segunda geração do iX3. Este Sport Utility Vehicle (SUV) estreia a sexta versão do sistema elétrico eDrive – baterias cilíndricas, por exemplo – e conteúdos digitais de ponta, muitos desenvolvidos em Portugal.
Construída para ser uma referência em matéria de sustentabilidade, a fábrica de Debrecen, unidade alimentada por energias renováveis, reúne uma série de avanços tecnológicos na área da produção, por isso recebendo o nome de i-FACTORY, designação que abrange a digitalização avançada, o controlo do processo logístico e, ainda, o reforço da competência humana.
O “casamento” entre o iX3 novo, que substitui SUV elétrico que a BMW produzia na China, e a fábrica nova serve para demonstrar a capacidade de adaptação do consórcio industrial alemão às necessidades voláteis do mercado e ao progresso tecnológico contínuo, explica Milan Nedeljkovic, membro da administração do construtor com o pelouro da produção.

“No geral, começar do zero com uma arquitetura nova e uma equipa nova é um desafio enorme. Percebemos muito cedo que precisávamos de preparar-nos bem, de forma muito intensiva. Por isso demos tanta ênfase ao planeamento virtual. Tecnologicamente, estou surpreendido com tudo o que conseguimos durante este processo. O desafio maior reside na introdução de tecnologias inéditas. Não se trata só de lançar o carro, mas sim de quão bem a fábrica tem de trabalhar desde o primeiro dia. Como o desenvolvimento do produto decorre em paralelo com a preparação do local de produção, temos de interagir de forma permanente e, se o produto mudar, precisamos de responder rapidamente às alterações”, explica Nedeljkovic.
“Como fabricante ‘premium’, estamos sempre preparados para a inovação. Encontrava-me em Leipzig, Alemanha, quando introduzimos o i3, carro que também foi muito inovador. Combinava alumínio e fibra de carbono, e era o primeiro BMW 100% elétrico. Então, pude ver como a marca foi capaz de trazer tecnologias completamente novas para um local, integrá-las num produto e nunca negligenciar a qualidade”, diz, salientando que Debrecen mantém essas competências.
Porém, o responsável máximo pela produção do grupo acrescenta que, além das razões objetivas de eficiência e capacidade de produção, o simbolismo de um produto novo num local novo também ajudou à escolha de Debrecen para produzir o iX3.
“Uma fábrica nova para um produto antigo faz pouco sentido. Não é bem o início de uma era. Mas, como estamos a criar uma arquitetura completamente nova, por que não combiná-la com uma fábrica nova? Esta decisão foi baseada, talvez, no lado simbólico. Fábrica nova, arquitetura nova. Sabemos que é arriscado, mas preparámo-nos muito bem. Agora, olhando para trás e percebendo que não existem problemas, podemos comemorar e dizer que conseguimos, fomos bem-sucedidos”, exclama.

As "lições" aprendidas com o i3
Milan Nedeljkovic também está vinculado a outro projeto de grande arrojo da BMW, tendo liderado a fábrica (Leipzig) que produziu o primeiro elétrico da marca, o i3. Numa nota curiosa, sucedeu na posição a Hans-Peter Kemser, presidente e diretor da fábrica húngara. Lado a lado, recordaram o impacto que o carro teve no desenvolvimento de procedimentos de produção e tecnologias.
“O projeto foi muito importante. Ambos temos ligações próximas a esse carro. Com o i3, em 2013, iniciámos a cultura associada à produção do automóvel elétrico novo. Começámos a prepara-nos para fazê-lo em 2008, o ano da tomada de decisão. Isto obrigou a mudar mentalidades na nossa organização. À época, e muito conscientemente, decidimos que este produto não seria viável, economicamente, na primeira geração. As baterias eram demasiado caras, a arquitetura também”, recorda Nedeljkovic.
“O i3 ensinou-nos muito, nomeadamente sobre as necessidades do clientes em matéria de carregamentos, autonomias, problemas de aquecimento e arrefecimento. E utilizamos tudo o que aprendemos nos automóveis novos”. Este projeto também representou uma "lição" em domínios como os métodos de produção. A BMW optou por processo mais tradicional de linha de montagem, embora otimizado em termos ergonómicos para os funcionários, ao invés de um método em que a dianteira, a secção central e a traseira são feitos de forma independente e unidos apenas numa fase posterior do processo, algo que a Ford aplicará na construção de carros elétricos a partir de 2027. Para Nedejkovic, isso foi feito com o i3 e, “mesmo que tenha vantagens, é desafiante para volumes de produção elevados”.
“Se tiverem um volume baixo, podem fazê-lo e, de alguma forma, encontrar o ponto ideal para a viabilidade económica. No entanto, aumentando-se os volumes, chega-se ao ponto em que é difícil atingir a rigidez ideal para o chassis. Para nós, que privilegiamos a condução e dinâmica, um dos maiores desafios é, precisamente, conseguir uma carroçaria muito rígida, a base para a agilidade, a estabilidade, a precisão e a segurança do carro. Com módulos independentes, esse nível de rigidez é inalcançável”, alerta.
Aço pela sustentabilidade
Para o arranque do iX3 e do “Neue Klasse”, a BMW escolheu o aço para a carroçaria, não misturas de materiais ou “megacastings”, grandes componentes fabricados numa só peça – alumínio, habitualmente – ,que reduzem a complexidade, o peso e os custos, mas trazem outro tipo de desafios, sobretudo no investimento e na reparação em caso de acidente.
“Olhámos para essas questões. Analisámos todas as opções, uma vez que os competidores estão a utilizá-las. Que benefícios nos traria? Durante a fase de desenvolvimento, quisemos simplificar e tínhamos de decidir: concluímos que o aço era muito melhor, também ao nível da reciclagem, que é muito simples”, conclui.


















